No Hospital Otávio de Freitas, que fica no bairro de Tejipió, Zona Sul do Recife, oito pacientes vivem uma situação de abandono por parte de suas famílias, recebendo apenas o carinho dos profissionais que trabalham na unidade de saúde. Eles têm paralisia cerebral, doença que compromete o cérebro e acontece ainda na gravidez, ou durante o parto. Dos oito, três nunca receberam visitas de parentes nos 26 anos de internação. Apenas um recebe a mãe toda semana. Outros dois são visitados em feriados como o Natal e no aniversário.
Somente na emergência, o Otávio de Freitas atende cerca de 8 mil pessoas por mês. No ambulatório, 400 pacientes são atendidos diariamente. Entre chegadas e partidas, os oito pacientes com paralisia cerebral estão lá há tanto tempo, que já não se diz mais que estão internados: moram em um pavilhão reservado para eles.
Por conta da doença, eles são como bebês: não falam, não sabem o nome e ignoram noções básicas de higiene e regras sociais. Mesmo assim, estabeleceram vínculo afetivo com os médicos e enfermeiras com quem convivem diariamente. Para o clínico Ronaldo Brito, esse atendimento atencioso é o que os mantêm vivos, já que pacientes com paralisia cerebral morrem cedo. “Não é comum que o paciente com paralisia cerebral viva tanto. Os nossos pacientes ultrapassam os 50 anos de idade”, comentou Brito.
Para a equipe médica, o carinho e o cuidado já não podem ser chamados de trabalho. Os pacientes são como bebês, que elas aprenderam a amar com o tempo. “Não sei ficar sem eles, já são 26 anos aqui. Minhas filhas morrem de ciúmes deles”, comentou a técnica de enfermagem Rita de Cássia.
Todos eles tomam remédios controlados, e a equipe conta ainda com fisioterapeuta, psicóloga e psiquiatra. O diretor do Otávio de Freitas, Antônio Barreto, fala sobre os papéis que deveriam ser da família e do hospital: “Eles na verdade foram pacientes abandonados pelas famílias. O hospital assumiu essa condição de tratá-los e mantê-los até agora”.
No início, eram dez pacientes – dois faleceram – que chegaram quando ainda eram jovens. Eles eram atendidos na Legião Brasileira de Assistência, que foi fechada. A partir daí, foram levados para o Otávio de Freitas, que contava com 200 leitos para psiquiatria.
Depois de anos, reformas e despedidas, os pacientes que ainda estão no hospital acabam de se tornar cidadãos, com documentos que certificam sua existência e direitos. “Até então eles não tinham nenhuma identificação. Não tinham sequer a possibilidade de, quando falecerem, serem reconhecidos. Seriam como ignorados”, comentou a assistente social Georgina Marinho.
Com a primeira vitória, os assistentes sociais agora tentam, junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o pagamento de benefícios para os pacientes. Por hora, o hospital não recebe mais pessoas com paralisia cerebral. Os que moram no Otávio de Freitas devem ficar na unidade até falecerem, dependendo de ajuda em todos os sentidos e vivendo em um mundo à parte, mas rodeados por uma “família” atenciosa.
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