OUVIDORIA POPULAR

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quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Médico é condenado por prescrever abortivo para antecipar parto

O obstetra Oscar de Andrade Miguel foi condenado a cinco anos de reclusão, em regime semi-aberto, em Porto Alegre, por lesão corporal de recém-nascido. Segundo a sentença divulgada nesta quarta-feira pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), o médico usou a substância misoprostol, medicamento cuja marca mais conhecida é o Cytotec, para antecipar um parto que se anunciava normal.

A decisão da 3ª Câmara Criminal foi por unanimidade e reformou sentença de 1ª instância que tinha absolvido o réu por insuficiência de provas. O obstetra diz que é inocente e que irá tentar reverter a decisão nos tribunais superiores.O caso ocorreu em fevereiro de 2000. Segundo o TJRS, na ocasião, a paciente foi convencida pelo médico a fazer um parto induzido em vez do natural e recebeu das mãos do obstetra um aplicador vaginal contendo meio comprimido de substância cujo nome ou procedência não lhe foram explicados. Segundo adenúncia, a decisão de antecipar o parto foi tomada tendo em vista que a maturidade fetal e também para garantir as férias da equipe médica.
Após seguir a orientação do médico, a gestante introduziu o medicamento e três horas depois passou a sentir fortes dores. Ela foi levada para o hospital, onde foi constatado sofrimento fetal agudo, sendo o parto realizado com o emprego de fórceps. O recém-nascido teve de ser reanimada, foi entubado e apresentou crises compulsivas. Aos seis meses, a menina foi submetida a exame de ressonância nuclear magnética, constatando-se leucoencefalomalácia, lesão cerebral que está associada à asfixia perinatal.
No entendimento do desembargador Ivan Leomar Bruxel, os laudos periciais e a prova colhida comprovaram a prática de crime de lesão corporal gravíssima. Segundo o seu voto, os depoimentos colhidos entre médicos ginecologistas e obstetras que conheciam o uso do Cytotec para indução de parto referiram que o procedimento normal é usar a droga em ambiente hospitalar, controlando as contrações uterinas e em especial verificando as condições do feto."Não se pode esperar que uma mãe e um pai leigos possam ser responsáveis pela administração da medicação em casa, quando esta foi entregue gratuitamente pelo seu médico de confiança, em consultório", afirma o relator. Segundo ele, o parto foi acelerado "desnecessariamente, por conveniência pessoal, diga-se, suas férias". Além de Bruxel, participaram do julgamento, realizado em 16 de dezembro, os desembargadores Newton Brasil de Leão e Odone Sanguiné.
O Cytotec é um dos nomes comerciais do misoprostol, que serve para induzir o parto em mulheres com dificuldades para ter dilatação e também para expulsar fetos presos no útero após abortos naturais. Desde 1998, a comercialização para o público em geral é proibida no Brasil – a permissão vale apenas para uso hospitalar.Procurado pelo G1, o obstetra disse estar com a consciência "tranquila". Ele afirmou que é inocente e que segue atendendo seus pacientes normalmente. "A gente tem que tocar a vida. Os cachorros latem e caravana passa", disse. Pela decisão, Andrade Miguel pode recorrer da condenação em liberdade.
O advogado do médico, Ney Fayet Júnior, informou que aguarda a publicação da sentença para ingressar recursos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF). "Foi uma pena draconiana. O fato ocorreu há 11 anos e existem 6 laudos que apontam que não há relação de causalidade entre a utilização do medicamento e o resultado", afirma. "Não se trata de experimento científico. Não se pode condenar diretamente o medicamentio, é uma questão de dosagem".
O Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers) informou que abriu uma sindicância para apurar a conduta do médico. "Não tínhamos conhecimento desse caso. O processo corria sobre segredo de Justiça e não foi feita nenhuma denúncia ao conselho", afirma Fernando Matos, presidente do Cremers.Segundo ele, serão solicitadas cópias do processo e das perícias, o médico será ouvido e só então se avaliará a abertura de um processo ético-profissional. Todo o trâmite deve durar pelo menos seis meses, Até lá, o registro do médico segue ativo e ele poderá continuar exercendo a restrição sem qualquer restrição.

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